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sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Polícia Federal apura propina no Ministério do Desenvolvimento


Um suposto esquema de venda de portarias do governo federal para favorecer empresas do setor automotivo está sob investigação da Polícia Federal. Mensagens interceptadas na Operação Acrônimo, obtidas pelo Estado, indicam que grupo automotivo CAOA, que produz veículos da Hyundai, pagou propina a um empresário ligado ao ex-ministro e atual governador de Minas, Fernando Pimentel (PT), em troca de obter benefícios fiscais no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), que ele comandou.

O inquérito sustenta que o petista teria participado pessoalmente da negociação dos “ajustes”, que ocorreram na gestão de Mauro Borges, atual presidente da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e sucessor do petista na pasta.

Conforme revelou o Estado, a CAOA também é suspeita de negociar pagamento de propina para que o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o Congresso aprovassem em 2009 a Medida Provisória 471, que prorrogou incentivos fiscais de montadoras que fabricam veículos no Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Os investigadores apuram se as negociações envolveram também corrupção para emplacar outras duas MPs: a 512/2010, que resolveu questões tributárias; e a MP 638/2014, que instituiu o Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores (Inovar Auto). As suspeitas foram detectadas em duas operações da PF e do Ministério Público Federal (MPF), a Acrônimo e a Zelotes.

Conforme o inquérito da Acrônimo, que corre em sigilo, a CAOA escalou Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, o Bené, amigo e colaborador de campanha de Pimentel, para obter a renovação de um ato que lhe assegurasse a permanência no Programa Inovar Auto, criado pelo petista e Borges. Com isso, a empresa conseguiria redução no valor a ser pago pelo Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

As mensagens, de fevereiro de 2014, revelam conversas de Bené com Borges, então ministro, e Antônio dos Santos Maciel Neto, presidente e sócio da CAOA, para viabilizar a portaria. Duas empresas de Bené, que seriam de fachada, receberam R$ 2,1 milhões entre dezembro de 2013 e junho de 2014. Para a PF, o dinheiro pode ter sido pago como propina.

No dia 27 de fevereiro, Maciel escreve a Bené sobre o projeto de interesse da empresa: “É um processo único da empresa toda. Tudo deve estar concluído às 16h”, ao que recebe a resposta: “Hoje a gente mata isso. Meu amigo está hoje em BSB e vai ver isso de perto”. Para a PF, o empresário se referia a Pimentel.

Já na madrugada do dia 28, Bené avisa ao executivo da CAOA: “Agora à noite estive com o substituto dele. Amanhã tudo vai se resolver”. Mais tarde, após raiar o dia, Maciel envia nova mensagem para Bené: “O nosso portador estará no edifício às 13h30. Você me ajuda para que a assinatura ocorra logo em seguida?”

As mensagens demonstram que o lobby funcionou. “Se você puder botar para andar aquele assunto que te falei ontem. ABS”, pediu Bené ao então ministro, que responde: “OK”. Às 22h27, Borges avisa a Bené: “Assinei”.

As investigações mostram que três desses repasses da CAOA para empresas de Bené, de R$ 919 mil, ocorreram entre março e maio de 2014, logo após o benefício ser concedido. O inquérito diz ainda que Pimentel teria se encontrado com o dono da CAOA, Carlos Alberto de Oliveira Andrade, e outros executivos para fazer “ajustes” na negociação.

Por causa das suspeitas, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou buscas, na semana passada, em endereços de Borges, Bené, executivos da CAOA e outros envolvidos. “Diversos registros devidamente documentados sugerem que Benedito, agindo de forma ajustada com Fernando Pimentel, teria intermediado a aprovação de benefícios para a produção do veículo iX35, da Hyundai, que dependia da autorização de Mauro Borges, então ministro que substituiu Pimentel”, escreve o ministro Herman Benjamin em despacho.

“Em contrapartida, a CAOA transferiu para as empresas Bridge Participações e BRO Consultoria, controladas por Benedito, cerca de R$ 3,5 milhões, conforme documentos já apreendidos na sede dessas empresas e residências dos envolvidos”, acrescenta o magistrado.

Envolvidos. Procurada pela reportagem, a CAOA informou ontem que não iria se manifestar. Segundo a assessoria de imprensa, a empresa estava “levantando documentação a respeito do caso” e, somente a conclusão desse processo, poderia responder aos questionamentos da reportagem.

O advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defende o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), afirmou que não iria se pronunciar sobre “partes da investigação”. “Isso só comprova que a PF (Polícia Federal) e o MPF (Ministério Público Federal) tinham as informações há mais de um ano e não as usaram para reunir mais detalhes. Estamos questionando todos os elementos do inquérito”, afirmou.

O criminalista Marcelo Leonardo, que defende o ex-ministro do Desenvolvimento Mauro Borges, disse que não vai se manifestar “porque a investigação está sob segredo de Justiça”. A Operação Acrônimo investiga outros negócios relacionados ao empresário.

José Luís de Oliveira, advogado do empresário Benedito de Oliveira, o Bené, afirmou que, “tendo em vista que o processo é sigiloso, todos os esclarecimentos serão apresentados no momento oportuno”.

Estadao Conteudo