Controladoria Geral da União e Tribunal de Contas do Estado cruzaram dados do programa federal com CPFs de funcionários públicos do Estado e de 181 municípios cearenses. Por serem empregados formais, eles não têm direito ao benefício criado durante a pandemia do coronavírus. Valor pago chega a R$ 16,5 milhões e deverá ser obrigatoriamente devolvido.
Investigação da Controladoria Geral da União (CGU), em parceria com o Tribunal de Contas do Estado (TCE), identificou que entre os que receberam indevidamente o auxílio emergencial no Ceará estão muitos servidores e empregados públicos. De diversas funções e categorias no Estado e nos municípios cearenses. Muita gente que, pela regra, não poderia alcançar o benefício por estar em emprego formal ativo.
Foram descobertos 24.232 servidores públicos no Ceará que podem já ter embolsado pelo menos a primeira das três parcelas de R$ 600. O montante distribuído irregularmente seria de "R$ 16.519.200 por parcelas pagas", segundo conclusão apresentada em relatórios de controle externo. Alguns servidores podem até já ter realizado o saque da segunda parcela. Esse rastreamento foi feito para pagamentos acumulados até 31 de maio último.
A análise abrangeu servidores da ativa, inativos e pensionistas estaduais e municipais. “Foram consideradas pessoas com vínculo empregatício com órgãos públicos do Ceará, podendo ser servidor efetivo, contrato temporário, estagiários, médicos”, detalham documentos da CGU. Apenas quatro cidades não tiveram servidores identificados no levantamento: Campos Sales, Hidrolândia, Jardim e São Benedito
Nem todos estariam citados com o crivo de má-fé. A Controladoria e o Tribunal de Contas admitem que possam constar na lista agentes públicos inseridos no Cadastro Único (Cad Único) que descreve os assistidos em programas sociais. Beneficiários do Bolsa Família e nomes no Cad Único tiveram o auxílio emergencial gerado automaticamente. Por isso o que foi apurado ainda está sendo tratado como “possível irregularidade”. Servidor que aparece com o nome no ExtraCad caracteriza que houve o pedido de fato, com provável intenção de fraude, por conta do preenchimento de dados no site da Caixa Econômica. Ainda assim, será avaliado se o CPF foi utilizado por terceiro.
Apesar da ressalva, o dinheiro do auxílio que saiu para quem não deveria ter recebido será cobrado de volta. Dois documentos expedidos conjuntamente por CGU e TCE - a Nota Técnica nº 1.371 e o Ofício Circular nº 109 - vão orientar Estado e Prefeituras na condução do ressarcimento individual aos cofres da União. Também indicam aos servidores como fazer diretamente a restituição ao erário.
Um trecho da Nota Técnica aponta aos órgãos e entidades "para que notifiquem os servidores, de forma individual e reservadamente, de que as condutas de solicitação e de recebimento do auxílio emergencial, mediante a inserção ou declaração de informações falsas em sistemas de solicitação do benefício, podem caracterizar os crimes de falsidade ideológica e estelionato, além de configurarem possíveis infrações disciplinares a serem analisadas no âmbito do Estado".
A estimativa da CGU e TCE é que o reembolso do dinheiro federal e a regularização pelos gestores aconteçam em até quatro semanas. Há em andamento uma outra investigação da CGU, conduzida pela direção geral do órgão em Brasília, para tentar identificar também servidores federais pelo País que tenham sido contemplados indevidamente com o auxílio.
A legislação prevê que mentir em informações cadastrais para receber dinheiro configura estelionato e falsidade ideológica. Com pena prevista de 1 a 5 anos de reclusão. Quando o crime envolve dinheiro público, a pena é aumentada e pode chegar a 6 anos e 8 meses. Receber o valor a que não tem direito, mesmo que não tenha feito a solicitação do benefício, pode enquadrar a pessoa denunciada no crime de apropriação indébita caso a quantia não seja devolvida. A previsão de pena vai de um mês a um ano de prisão. Como são três parcelas, se não houver a restituição do dinheiro público, o crime é considerado em andamento e o acusado pode ser autuado em flagrante.
Para desenhar o tamanho da irregularidade, CGU e TCE recorreram a base de dados da Receita Federal, da Caixa Econômica, do Estado e dos municípios. Cruzaram a relação de CPFs inserida no cadastramento do auxílio emergencial com as folhas de pagamentos das administrações do Estado e das prefeituras cearenses. O trabalho de checagem, em programas de computadores, se estendeu por mais de duas semanas.
“Nenhum nome será divulgado para a imprensa. Essa não é a nossa intenção. E cada órgão, Prefeitura ou Estado, receberá a lista somente dos seus respectivos servidores”, confirmou o superintendente da CGU no Ceará, Giovanni Pacelli. Se a fraude não tivesse sido descoberta a tempo, o valor total liberado indevidamente poderia chegar ao triplo da cifra estimada.
O auxílio emergencial foi criado pelo Governo Federal, aprovado pelo Congresso em abril deste ano. O recurso é destinado a trabalhadores informais, Microempreendedores Individuais (MEI), autônomos e desempregados, como medida de proteção para enfrentamento à crise causada pela pandemia do coronavírus. São três parcelas de R$ 600. Já foi batido o martelo no Ministério da Economia para 4ª e 5ª parcelas, no valor de R$ 300, cada. O calendário de pagamento está em curso. Nesta sexta-feira, 12, por exemplo, está prevista a parcela dois do auxílio para os cadastrados nascidos em novembro. No caso dos servidores identificados, o benefício para o CPF já foi cortado, segundo Pacelli.
Como devolver, em caso de irregularidade
Como denunciar uso do CPF por terceiros
Se um servidor suspeitar que seu CPF e outros dados pessoais tenham sido utilizados por terceiros para obter o auxílio emergencial, uma denúncia deverá ser feita através da Plataforma Integrada de Ouvidoria e Acesso à Informação - Fala.BR, no endereço eletrônico https://sistema.ouvidorias.gov.br/
(O Povo)
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