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terça-feira, 11 de novembro de 2014

Após denúncias do Fantástico, Câmara de Vereadores do Crato não descarta criação de CPI



A Câmara de Vereadores do Crato, região do Cariri, não descarta a possibilidade de criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar as denúncias divulgadas no último domingo (9), através do quadro “Cadê o dinheiro que tava aqui?”, do programa semanal Fantástico, da Rede Globo de televisão. Segundo a reportagem, há indícios de superfaturamento e desvio de recursos públicos efetuados pelas Prefeituras de Crato e Juazeiro do Norte, durante os anos de 2012 e 2013. As suspeitas foram confirmadas ao programa pelo procurador da República Rafael Rayol, que comanda uma investigação em torno de aquisições de merenda escolar, através de possível ação fraudulenta, no âmbito do Ministério Público Federal.

Conforme as denúncias, o casal Eduardo Ferreira e Cícera da Silva teria criado duas empresas, a Cícera da Silva ME e a EV.Ferreira ME, para participarem de certames públicos para fornecimento da merenda escolar às unidades educacionais do município de Crato, em 2012, durante a gestão do ex-prefeito Samuel Araripe (PSDB). Uma das empresas investigadas é uma livraria de pequeno porte. Juntas, as duas empresas receberam cerca de R$ 1,2 milhão do município, através de processos licitatórios. A empresa onde na verdade funciona uma papelaria, tinha por obrigação contratual o fornecimento de produtos alimentícios ao município, como ovo tipo marrom, sal iodado, rapaduras e mistura para mingau, por exemplo. Relatório da Controladoria Geral da União (CGU) aponta, no entanto, que ambas as empresas possuem características de “empresas de fachada”, utilizadas em esquemas de desvio de recursos públicos em diversos municípios do país.

Entrevistados pelo programa, nenhum dos dois empresários soube explicar como conseguiram realizar a entrega da merenda adquirida pelo município sem ao menos possuir local para armazenamento dos produtos ou, então, estoque das mercadorias contratadas. O valor dos contratos celebrados junto às empresas foi de R$ 866 mil em favor da EV. Ferreira ME e de R$ 343 mil em benefício à Cícera da Silva ME.

Nesta segunda-feira (10), Durante sessão ordinária da Câmara de Vereadores, parlamentares cobraram o aprofundamento das investigações pelo Ministério Público e a participação do Legislativo nas investigações. O presidente da Câmara Municipal, Luís Carlos Saraiva (PSL) disse que a possibilidade de criação de uma CPI existe, no entanto, informou que a Mesa Diretora aguardará uma provocação por parte dos demais parlamentares para então se manifestar a respeito do assunto. “A comissão poderá ser solicitada a qualquer momento. Mesmo que não seja realização uma CPI, há possibilidades de ser formado um colegiado para aprofundar as investigações por parte do Poder Legislativo. Nós vamos aguardar os acontecimentos para então nos manifestarmos de maneira mais aprofundada”, disse o presidente da Casa.

Para o líder do prefeito Ronaldo Sampaio Gomes de Matos (PMDB) na Câmara, que também foi citado na matéria do Fantástico por conta da demora na realização de exames de média complexidade autorizados pela Secretaria Municipal de Saúde, Paulo de Tarso (PMDB), a Câmara tem obrigação constitucional no aprofundamento das investigações. Ele ponderou, no entanto, que é preciso tranquilidade em relação às denúncias e que a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, neste momento, poderia não alcançar o objetivo pretendido pela própria população de Crato. “A priori não se sabe se há ou não irregularidades cometidas. A Câmara vai realizar as devidas investigações e auxiliar o Ministério Público naquilo que lhe for necessário. Não creio, no entanto, que haja motivos, pelo menos no atual momento, da criação de uma CPI. Caso ela venha a existir será muito mais por questões políticas do que pela necessidade de investigar as denúncias”, observou.

Já o vereador Roberto Anastácio (Pros), defendeu que a Comissão seja realizada imediatamente, ampliando-se as investigações também para atos cometidos pela atual gestão municipal. “O município recebeu uma fiscalização feita por técnicos do Tribunal de Contas dos Municípios há cerca de alguns meses e, segundo o próprio relatório da diretoria de fiscalização do órgão, observou-se que produtos da merenda escolar foram contabilizados e pagos a fornecedores sem que tivessem realmente sido recebidos. O parecer informou que no sistema do almoxarifado da prefeitura foram lançados, aproximadamente, 14 toneladas de alimentos, sem que os produtos realmente estivessem estocados. E o pior é que foi tudo pago. Essa situação criada na gestão do atual prefeito também merece e precisa ser investigada”, defendeu o parlamentar.

Estoque de alimentos

A reportagem apurou que da relação contabilizada no sistema do almoxarifado da prefeitura de Crato constavam 3.500 kg de banana, 1.415 kg de batata doce, 519 kg de jerimum, 1.224 kg de macaxeira, 1.754 kg de mamão, 2.882 kg de manga, 941 kg de pimentão, 1.889 kg de tomate, perfazendo um total de 14.163 kg de alimentos. O relatório do TCM diz que: “foi informado, ainda no local da inspeção, que tais itens são distribuídos às unidades educacionais tão logo chegam ao almoxarifado”. O documento diz, ainda, que “ainda que tal procedimento seja a rotina procedimental, não restou esclarecida a existência de 14 toneladas de gêneros no estoque que, efetivamente, no almoxarifado não estavam”.

A reportagem apresentada pelo programa da Rede Globo também fez referência ao município de Juazeiro do Norte. Na terra de padre Cícero, a gestão comandada pelo prefeito Raimundo Mâcedo (PMDB) teria realizado a contratação da empresa Distrimed para realização de entrega de merenda escolar ao município, sem o devido processo licitatório para tal finalidade. Conforme o Ministério Público Federal (MPF) houve superfaturamento de R$ 350 mil na contratação da empresa pelo município. O órgão ministerial também afirma que o processo contou com a falsificação de documentos na construção da ação fraudulenta.

Ambas as gestões municipais responderam as denúncias apresentadas pelo Fantástico através de Notas de Esclarecimentos. A Prefeitura de Juazeiro do Norte informou que as empresas citadas na reportagem, não fornecem mais nenhum tipo de produto ou serviço para o município de Juazeiro do Norte. A empresa Distrimegi foi contratada num período emergencial para fornecimento de merenda escolar no início de 2013 e teria realizado, segundo a Nota da Prefeitura, a entrega de todos os produtos conforme contrato firmado com o município. O documento diz, ainda, que o prefeito do município, Raimundo Macêdo, apoia todas as investigações do Ministério Público com relação ao caso e a consequente punição dos envolvidos e que o município está disponibilizando todas as informações necessárias para que o Ministério Público possa realizar o seu trabalho.

Em relação à cidade do Crato, o prefeito Ronaldo Sampaio Gomes de Mattos, participou na tarde desta segunda-feira (10) de uma coletiva de Imprensa onde expôs esclarecimentos relacionados ao setor de saúde do município. Ao lado da secretária de Saúde, Aline Franca, do Procurador do Município, George Borges, e do secretário de Educação do município, Robério Alves, o gestor não quis comentar as denúncias relacionadas à contratação das empresas apresentadas pelo Fantástico, durante a gestão do seu antecessor.

O prefeito confirmou, no entanto, que há demora em relação a alguns atendimentos de média complexidade, alegando que a falta de maior percentual de recursos para o setor, na maioria das vezes, é o causador dos problemas. “Nós investimos, até agosto deste ano, mais de 23% dos recursos na área da saúde. Quando recebemos o município havia poucas equipes do Programa Saúde da Família, hoje são 40 equipes. Significa que nos duplicamos os atendimentos, as consultas e a distribuição de medicamentos. No entanto, ainda há necessidade de maior investimento do Governo Federal juntos aos municípios para que a população seja atendida a contento. O recurso não cobre a demanda”, afirmou.

A secretária de Saúde de Crato, Aline Franca, informou que as filas geradas para realização de exames, como mamografia, por exemplo, se deram por conta da desincompatibilização de duas clínicas que atendiam o município. Com a contratação de uma nova clínica, o número de consultas voltou a ser ampliado e, atualmente, não há mais filas de espera.

Ronaldo Sampaio esclareceu, ainda, que a quantidade de alimentos adquirida pelo município e não encontrada pela fiscalização do TCM foi realmente comprada pela administração. Segundo ele, os produtos, a maioria oriundos da agricultura familiar, não estavam no almoxarifado do município na data da fiscalização por terem sido entregues diretamente nas unidades educacionais. “Eu desafio qualquer órgão de fiscalização, ou qualquer cidadão que seja, a provar que esta administração faz pagamento de quaisquer que sejam os gêneros ou produtos sem que estes adentrem o município”, afirmou o gestor dizendo não temer a instalação de uma possível CPI pela Câmara de Vereadores.

O gestor também informou que determinou a realização de uma auditoria, no início da gestão, para identificar a existência de empresas fantasmas que atuavam no município. “Nós identificamos algumas empresas e, posso garantir, não há, nessa gestão, uma única contratação que não tenha sido realizada com a certeza da idoneidade das empresas contratadas”, concluiu.


fonte Diário do Nordeste.