Dos 32 municípios que possuem frota de ônibus municipais, metade não possui adaptações, conforme IBGE
Todo dia é uma aposta para a estudante universitária Shirley Kátia, 28, ao esperar o ônibus para a faculdade. Afinal, não há como prever se a plataforma elevatória estará funcionando para embarcá-la sentada na cadeira de rodas - ou mesmo saber se o ônibus está equipado com o mecanismo. Muitas vezes, o acesso ao transporte público coletivo e o direito básico ao deslocamento enfrentam obstáculos porque, das 32 cidades cearenses que possuem frota de ônibus municipais, metade não possui adaptações para pessoas com deficiência (PCDs) ou mobilidade reduzida.
Do total, apenas três possuem a frota "totalmente adaptada" às necessidades das PCDs: Horizonte, Irauçuba e Juazeiro do Norte. Além disso, 13 municípios têm veículos "parcialmente adaptados", abrangendo Fortaleza, algumas cidades da Região Metropolitana e outros municípios do Interior. Os dados são da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic) 2017, elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e divulgada nesta quinta-feira (5). Na prática, verifica-se uma situação oposta à teoria da Lei federal Nº5.296/2004, em vigor há quase 14 anos.
A norma define que a infraestrutura de transporte coletivo deve "ser acessível e estar disponível para ser operada de forma a garantir o seu uso por pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida". As providências necessárias deveriam se estender ainda aos terminais, às estações, aos pontos de parada e às vias de acesso ao transporte coletivo. Dos tipos de adaptações adotadas para o embarque e desembarque de passageiros, quatro cidades informaram que seus veículos têm piso baixo; três têm frota com piso alto com acesso realizado por plataforma de embarque/desembarque, e sete possuem ônibus com piso alto equipado com plataforma elevatória veicular. Em nove cidades, as gestões municipais também fornecem isenção da tarifa de transporte para as PCDs - incluindo a Capital.
Manutenção
É na cidade que, diariamente, Shirley Kátia pega dois ônibus. Ou quatro, às segundas e quartas, quando também vai para o treino de basquete. "A dificuldade que eu vejo é o funcionamento. Eles não dão manutenção, então já peguei ônibus novos com a plataforma quebrada", denuncia a paratleta. Com a tentativa de embarque frustrada, o jeito é esperar pelo próximo veículo, com o atraso para os compromissos já causando impaciência - um problema que ela também enfrenta dos outros passageiros.
"Já aconteceu comigo de o ônibus parar e o pessoal reclamar 'Ah, tá demorando muito'. Falam quando o motorista está manuseando o aparelho e reclamam quando quebra. O preconceito ainda existe, infelizmente", indigna-se.
Apesar dos contratempos, para ela, que já utilizou o transporte coletivo em Porto Velho e Recife, Fortaleza "está no céu". O ideal mesmo, indica a usuária, é a verificação semanal do sistema de elevação; se possível, antes mesmo de os veículos deixarem as garagens.
A Empresa de Transporte Urbano de Fortaleza (Etufor) e o Departamento Estadual de Trânsito do Ceará (Detran-CE) foram procurados pela reportagem, mas até o fechamento desta matéria, não enviaram respostas.
Fique por dentro
Sindiônibus faz campanha de sensibilização
No fim de março deste ano, o Ministério Público do Estado do Ceará (MP-CE) celebrou um Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta (TAC), com o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do Ceará (Sindiônibus), para garantir a prioridade e a segurança no embarque e desembarque de idosos e pessoas com deficiência em ônibus dentro dos terminais abertos e fechados de Fortaleza. O Sindicato se comprometeu a realizar campanhas educativas para assegurar os direitos desses passageiros, considerados usuários "hipossuficientes e hipervulneráveis".
A entidade informou que, atualmente, está desenvolvimento o material para, então, submetê-lo ao crivo do MP-CE. No prazo de 90 dias após o aval, deverão ser distribuídas as orientações sobre os procedimentos de embarque preferencial a todos os motoristas e cobradores das empresas urbanas associadas. Além disso, o Sindicato se comprometeu a realizar campanha publicitária para divulgar o direito ao embarque prioritário e a assentos reservados a idosos e pessoas com deficiência, entre 27 de março e 27 de setembro de 2019.
Saiba mais
Frota sem adaptação
Aquiraz, Barbalha, Bela Cruz, Boa Viagem, Icó, Itatira, Jaguaribara, Jaguaribe, Missão Velha, Morada Nova, Moraújo, Pacatuba, Paramoti, Pedra Branca, Redenção e São Gonçalo do Amarante
Parcialmente adaptada
Aracati, Canindé, Caucaia, Crato, Eusébio, Fortaleza, Maracanaú, Maranguape, Massapê, Meruoca, Paracuru, Sobral e Trairi
Totalmente adaptada
Horizonte, Irauçuba e Juazeiro do Norte
Fonte: MUNIC 2017/IBGE