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sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Homem situação de rua consegue enterrar companheira

Cláudio compartilhava o barraco com Ana Paula há 20 anos. Apesar de convites para retornar para casa, eles recusavam sair das ruas ( FOTO: FABIANE DE PAULA )

Em meio a burocracia dos serviços públicos, cercado por montantes de arquivos e exames comprobatórios, a história de amor do morador de rua Cláudio Henrique Ferreira, 49, e da sua companheira Ana Paula, falecida no último dia 25 de julho, se concluiu com um enterro digno. Depois da emissão de vários documentos para provar a relação estável do casal, por meio de liminar da Defensoria Pública Geral do Ceará, Cláudio conquistou o direito de velar a esposa.

O enterro ocorreu na tarde desta quinta-feira (4), por volta de 14h30, no cemitério do Bom Jardim. O problema para enterrar a parceira ganhou repercussão por meio do Facebook, durante a última semana. "Fico mais tranquilo sabendo onde ela vai estar. A saudade está sendo grande. Ela cuidava de tudo na nossa casinha. Não sei como serão meus dias sem o meu amor", declarou o Cláudio, que apesar dos convites da irmã para retornar ao lar, prefere viver na praça próximo à Av. Luciano Carneiro com seus três cães vira-latas.

De pé desde às 6h, arrumado com uma calça jeans, blusa limpa e chinelos, ele aguardava um carro do Centro Integrado de Referência sobre Drogas (Cird) da Prefeitura. Por volta de 9h30, o veículo chegou no estacionamento da Perícia Forense do Estado do Ceará (Pefoce).

Lá, acompanhado da assistência social que o auxilia desde a morte de Ana Paula, ele recebeu a informação que seria autorizada a retirada do corpo da parceira. Com os olhos cheios de lágrimas e a voz embargada, ele destacou a alegria de poder enterrá-la. "É uma alegria muito grande. Também sou gente e tenho direitos". Ao ser questionado sobre apoio nas redes sociais, Cláudio demonstrou gratidão. "São pessoas que caíram do céu. Nunca imaginei que isso ocorreria na minha vida", comentou.

A urna funerária da companheira de Cláudio foi disponibilizada pela Prefeitura de forma gratuita e o enterro no Cemitério do Bom Jardim. Para conseguir o serviço é necessário encaminhamento de ofício do acolhimento familiar da Pefoce para assistente social do Serviço de Verificação de Óbitos (SVO) ou do hospital.

Crimes

Para o Coordenador do Medicina Legal da Pefoce, Renato Evando Moreira Filho, o primeiro cuidado que o órgão tem é realizar identificação do corpo para averiguar se de fato existe parentesco. "Procuramos fazer a prova técnica por meio de DNA e papiloscopia. Existem pessoas que fazem se passar por terceiros com a identificação de mortos". Conforme o gestor, existem falsários e estelionatários já capturados pela Polícia devido ao trabalho da pericia.

No caso da mulher do morador de rua, o coordenador ressalta que foi necessário realizar essa identificação por meio da papiloscopia, pois o nome que foi dado por Cláudio era diferente do encontrado na documentação dela, identificada por Emília. "Uma vez esgotada toda a documentação é possível recorrer para vias judiciais, como por meio da Defensoria", explica.


O coordenador traça como perfil das pessoas que são dadas como "sem documentos ou sem reclamação de corpo", na maioria dos casos sendo moradores de rua, na Capital e no Interior. "Temos casos de residente em espaços públicos que dão entrada na Pefoce com 18 anos e se quer foi emitido um registro civil, como RG e CPF, ou seja, legalmente esse individuo nem existe", ressalta o profissional. A Pefoce em Fortaleza, atualmente, recebe corpos da Capital e Região Metropolitana.

Por João Lima Neto - Repórter