Crato. A secretária de Educação deste município anunciou, no início da semana, que fechará dez escolas da zona rural via nucleação. Os alunos das unidades de ensino serão remanejados, segundo a Prefeitura, para escolas do perímetro urbano. A justificativa seria a "contenção de gastos", o que não convenceu professores de uma das escolas. "Educação não é gasto, é investimento", advertiu a docente Aparecida Nascimento.
No colégio em que ela leciona, 46 alunos já estão sem aula desde o dia 21, e as matrículas foram suspensas. A Escola de Ensino Infantil e Fundamental Dedé Pinheiro, situada no Sítio Currais, atende, de acordo com a professora, jovens de três comunidades rurais. O prejuízo com o fechamento é imediato.
A assessoria de comunicação do Crato informou que "ano letivo de 2016 está suspenso". A medida afeta, ainda, as comunidades dos sítios Páscoa, Riacho Vermelho e Cruzeiro.
Protesto
Na manhã da segunda-feira passada, professores, pais e alunos protestaram, em frente à Escola Dedé Pinheiro, contra o fechamento das unidades. O agricultor Francisco de Oliveira Cordeiro condena a decisão e ressalta que não confia na segurança do transporte oferecido para as crianças. "Na minha vida eu não estudei quase nada. Aí meu filho quer acabar os estudos, só que desse jeito vai ser difícil", critica.
O autônomo Dailton de Lima é taxativo ao dizer que o filho, de apenas 10 anos, não irá estudar em outra escola. "Prefiro que meu filho fique em casa, sem estudar e em segurança, do que ser transportado por ônibus em condições precárias". Ele lembra que, no ano passado, um ônibus de transporte escolar teve um pneu estourado durante o trajeto entre duas escolas. Apesar do susto, ninguém se feriu.
Mirene da Silva trabalha como merendeira na escola há cinco anos e diz que os efeitos negativos vão além da educação. "Aqui também funciona um posto de saúde. Uma vez por mês temos médico e enfermeiras para atender a população. Com o fechamento da escola, o PSF também será suspenso", acrescenta.
Temor
Além da incerteza quanto ao futuro do ano letivo para os estudantes, professores estão temerosos quanto a possíveis demissões. Isto porque a Prefeitura ainda não se posicionou se haverá ou não dispensa.
A assessoria do Município limitou-se a dizer que o "objetivo é evitar desligamentos". Os concursados, como é o caso de Mirene, temem serem remanejados para locais distantes de suas residências. "Sem Escola, a Prefeitura vai me colocar para longe.
Então como irei trabalhar?", questiona.
Na próxima segunda-feira, professores e pais dos alunos das dez escolas realizarão um ato em frente ao prédio da Secretaria de Educação do Crato cobrando a anulação da decisão.
O anúncio do fechamento das escolas foi feito seis meses após a divulgação do ranking de municípios com piores rendimentos no Sistema Permanente de Avaliação da Educação Básica (Spaece). Crato foi o sexto pior município, com índice de proficiência de 145,5. Juazeiro do Norte amargou a última posição, com índice de apenas 136,8.
Direito
O presidente do PCdoB, diretório Crato, Antônio Carlos Ferreira, acionou o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), pedindo a "imediata suspensão e anulação" do processo de fechamento de escolas públicas municipais na zona rural.
O presidente pede que "a municipalidade entenda a educação como direito inalienável, acessível a todos e de qualidade, e restabeleça o diálogo com as comunidades a fim de aperfeiçoar estratégias de gestão e aprendizagem, em benefício das metas previstas em Lei".
Ainda conforme oficio encaminhado ao Ministério Público do Estado do Ceará, Antônio Carlos adverte que "o fechamento ou nucleação das escolas públicas municipais próximas às residências de crianças e adolescentes matriculados, em execução pela Prefeitura, dificulta o acesso destas a esse serviço institucional essencial, interrompe seus vínculos culturais, inviabiliza o convívio comunitário na origem, atenta contra a segurança com transporte escolar inadequado, impossibilita cuidados familiares para os de menor idade e provoca abandono escolar, dentre outros males".
Autonomia
O líder partidário ressaltou que o fechamento de escolas públicas municipais pela Prefeitura, "é um desrespeito à Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Lei 12.960, de 12 de março de 2014".
Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da Secretaria de Educação do Estado (Seduc) informou, sobre o fechamento de escolas rurais no Interior, que as redes municipais de educação têm autonomia para gerir suas escolas e a Secretaria da Educação não dispõe de informações gerais a respeito.
O Presidente da União dos Dirigentes Municipais de Educação do Ceará (Undime), Regivaldo Freires, disse que "a nucleação é um processo de responsabilidade de cada município, portanto, os prefeitos e secretários de Educação municipais possuem autonomia para deflagrar esse processo.
A entidade não tem como interferir, embora recomende aos gestores que tomem todas as medidas necessárias na condução do processo, tais como ouvir a comunidade, a fim de evitar qualquer prejuízo no processo de ensino e aprendizagem".
Diálogo
No município de Ocara, onde atualmente Regivaldo Freires é Secretario de Educação, ele destacou que "foi realizada a reorganização da rede, mas tendo como princípio a gestão democrática, com base no diálogo, de modo que o processo ocorreu de forma tranquila".
Regivaldo lembra, ainda, que a crise econômica tem contribuído para o processo de nucleação de escolas, visto que o reajuste do piso do magistério, determinado pelo governo federal não corresponde à entrada de "dinheiro novo". Ou seja, "as administrações passaram a gastar mais com o ensino, enquanto que as receitas não acompanharam os mesmos patamares".
Enquete
Como avalia a atitude tomada?
"Vai prejudicar estudantes, professores, pais e a comunidade. A escola era uma referência para nós. Agora, para as crianças continuarem os estudos, terão que enfrentar transportes precários e inadequados"
Dailton de Lima
Autônomo
"Vai ser péssimo para comunidade. Além de perder uma escola de qualidade, perderemos o PSF, que funciona no mesmo prédio. Sem escola e sem PSF, o prédio vai acabar atraindo drogados e assaltantes"
Elizângela Façanha
Estudante
Mais informações:
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Diário do Nordeste