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terça-feira, 12 de agosto de 2014

Processo de R$ 116 milhões, por improbidade, fica parado na Justiça do Ceará

Dorme nas prateleiras da Justiça do Ceará denúncia de improbidade administrativa, por Ação Civil Pública, sobre repasse considerado ilegal superior a R$ 116 milhões, feito na Prefeitura Municipal de Fortaleza na área da Saúde.

As verbas foram destinadas ao Instituto de Desenvolvimento Tecnológico e Apoio à Gestão de Saúde (IDGS), escolhido irregularmente em 2008, na administração da então prefeita Luizianne Lins (PT), para prestar serviços de terceirização de mão de obra à Secretaria Municipal de Saúde do Ceará, segundo representação feita ao Ministério Público do Estado pela empresa Fama Serviços de Limpeza e Representações Ltda.

A ação corre há mais de um ano. Dela emergem cinco nomes e uma organização, cuja condenação foi pedida pelo promotor de Justiça de Defesa do Patrimônio Público, Ricardo de Lima Rocha. São eles: Luiz Odorico Monteiro de Andrade (secretário de Saúde em 2008), Alexandre José Mont’Alverne Silva (secretário de Saúde em 2009 e 2010), Messias Barbosa Lima, José Roger Barros Cavalcante, Reginaldo Alves das Chagas e o próprio IDGS, uma organização não-governamental.

O mentor e cabeça do grupo denunciado, segundo o Ministério Público, é Luiz Odorico Monteiro de Andrade. Médico de formação, extenso currículo acadêmico e passagem por instituições como a Fiocruz e o Ministério da Saúde, onde ocupou a Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa na gestão do então ministro Alexandre Padilha, Odorico Monteiro é apontado como idealizador do IDGS, para quem teria indicado – como secretario de Saúde de Fortaleza – os nomes dos integrantes da primeira diretoria da organização.

Hoje candidato a deputado federal pelo PT do Ceará, Odorico Monteiro usa em campanha sua fotografia ao lado da presidente Dilma Rousseff – é a página inicial dele no Facebook. Aparece também, na internet, ao lado do ex-chefe, o ex-ministro Alexandre Padilha, candidato petista a governador no Estado de São Paulo, em diferentes eventos públicos. De todos os denunciados, apenas ele ainda não foi notificado para se defender – por estar viajando, segundo certidão do Oficial de Justiça. “Vamos requerer outras formas de citação dele”, avisa o promotor Ricardo Rocha.

Contrato ilegal
O representante do Ministério Público do Ceará pede a indisponibilidade dos bens dos acusados nos atos de improbidade administrativa, além de perda do cargo público para aqueles que o exercerem, perda dos direitos políticos, devolução dos valores gastos ilegalmente, multa e proibição de contratar com o poder público – inclusive com eventual ressarcimento integral do dano causado.

Mas o processo segue a passos lentos. “Infelizmente, a Justiça é muito lenta”, afirma o promotor Ricardo Rocha. Ele explica que agora os denunciados deverão apresentar defesa prévia. Depois disso o Ministério Público deverá se pronunciar sobre o que foi justificado e ratificar ou não o conteúdo da ação inicial. Recebida a Ação Cívil Pública, serão citados para, querendo, apresentar nova manifestação no prazo de 15 dias. Só depois o Ministério Público poderá pedir o julgamento antecipado da ação, já que a prova é eminentemente documental”, afirma.

Baderna proposital
O promotor classifica de “tremenda baderna administrativa” o processo de escolha e de prestação de contas dos gastos realizados pela Secretaria de Saúde de Fortaleza com o IDGS. "Essa desorganização costuma ser proposital para dificultar aos órgãos de fiscalização a constatação de ilegalidades”, diz ele. “Dentre inúmeras falhas apontadas no processo de prestação de contas, que, diga-se de passagem, foi tomada praticamente à força pelo Tribunal de Contas do Município, houve a recusa de entrega de alguns contratos, conforme foi citado pela Inspetoria de Fiscalização do TCM”. O promotor lembra ainda que Luiz Odorico Monteiro de Andrade sequer apresentou justificativas para a este caso.

A ação revela diversos problemas nos contratos, como alguns terem sido firmados mesmo antes de o IDGS ser considerado Organização Social; a contratação também não poderia ocorrer com dispensa de licitação, o que atinge diretamente os dois secretários envolvidos nas contratações: Luiz Odorico Monteiro de Andrade e Alexandre José Mont’Alverne Silva. Segundo ele, a natureza de Organização Social do IDGS, motivo alegado para se efetuar a dispensa de licitação, “nem de longe preenche as condições legais para tal e, portanto, a licitação não poderia ter sido dispensada”.

Ricardo Rocha acrescenta que as prestações de contas feitas para a Comissão de Acompanhamento e Controle “não passavam de pura enganação”: eram feitas antes mesmo do término do período e algumas chegavam a ser realizadas duas ou três vezes". Mais: "Não se vislumbram dos processos de dispensa de licitação qualquer critério de seleção para a escolha do contratado, além de não ter sido sequer definido de forma clara e objetiva o objeto dos respectivos contratos".

"Pasmem"
O promotor, que utiliza a palavra "pasmem" para definir o episódio, vai além. Reginaldo Alves das Chagas, nos contratos de n.º 001/2008 (1/10/2008) até o de n.º 004/2009 (2/3/2009), e José Roger Barros Cavalcante, nos demais contratos e aditivos, eram ao mesmo tempo representantes do IDGS (entidade contratada) e servidores municipais, subordinados da Secretaria de Saúde de Fortaleza (contratante).

Os denunciados praticaram ação dolosa e provocaram perda patrimonial à gestão pública, segundo Ricardo Rocha. "Facilitaram e concorreram para incorporação ao patrimônio particular de pessoa jurídica de verba pública, dispensaram indevidamente processo licitatório, liberaram verba pública sem a observância das normas pertinentes, permitiram que terceiro enriquecesse ilicitamente, tudo em conluio".

A OS e Odorico
Notícia de dezembro de 2012, publicada pelo jornal O Povo, do Ceará, revela que Odorico Monteiro teria sugerido nomes para o IDGS. Messias Barbosa Lima, um dos denunciados pelo Ministério Público, no mesmo processo, disse que a criação da organização social foi sugerida por Odorico Monteiro.

Segundo o mesmo Messias, Odorico teria falado das vantagens em contratar uma organização social, por ser isenta de imposto de renda e contribuição patronal ao INSS. Antes da constituição da entidade, teria convidado cada um dos 10 nomes que compuseram sua primeira diretoria, afirma Messias. Como Messias já era servidor municipal, sua permanência na entidade pouco durou, explicou. “No tempo em que estive na composição do IDGS não chegou a ser feito nenhum repasse da Prefeitura”, defendeu-se.

Quando o caso veio a público, o hoje candidato a deputado federal Odorico Monteiro (PT) era secretário de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde, que saiu, então, em sua defesa. Em nota, o Ministério afirmou que Odorico Monteiro ocupou a Secretaria Municipal da Saúde (de Fortaleza) apenas nos quatro primeiros meses de atuação do IDGS, período em que só foram pagos R$ 1,9 milhão. Durante esse período foram assinados cinco contratos, com a aprovação do conselho administrativo responsável, e, apesar de assinados em outubro, só foram publicados em novembro, segundo o Ministério.

O iG tentou ouvir a versão de Odorico Monteiro sobre a ação do Ministério Público. Não obteve retorno. Os demais envolvidos não foram localizados. O servidor público Reginaldo Alves das Chagas, um dos denunciados, não é qualificado na abertura da ação; seu nome é citado no decorrer do processo e, ao final, no pedido de condenação, feito pelo promotor Ricardo Rocha.

* Com informações do Portal IG
Fonte:  Ceará News