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domingo, 24 de abril de 2016

Seca gera fuga de investimentos na fruticultura do Ceará

Maiores produtoras de melão do País ­e com sede no Ceará -, Carlos Prado lamenta o "fato de o Ceará não ter água suficiente para atender à população e à produção irrigada", apesar de todos os esforços do governo estadual para "impedir que se perdesse as culturas que estavam implantadas". No entanto, ele explica, os contratos fechados para fornecer frutas aos mercados brasileiro e internacional não podem ser descumpridos sob a pena de falir as empresas, o que faz dessa ida para outros estados "uma tendência natural para um caso desse".

Diante disso, atualmente, ele está preparando terras para cultivo nos estados do Piauí e da Bahia, além de negociar terras no Rio Grande do Norte. "Temos todo o nosso plano B em andamento para não falhar com nosso cliente. R$ 100 milhões foram aplicados, pois nesses locais já tinha estrutura estabelecida com terras, poços e foram feitas só adaptações", detalha.

O mesmo acontece com a maior produtora de frutas do País instalada no Ceará, a Agrícola Famosa, que paralisou o cultivo de melão em dois mil hectares e dispensou cerca de mil funcionários apenas no perímetro irrigado do Tabuleiro de Russas, onde a empresa considera a situação mais crítica.

"A diversificação de culturas, que nós gostaríamos de fazer tudo dentro do Ceará, até porque a infraestrutura e o porto por onde exportamos está aqui, tivemos de fazer fora por causa das culturas de longo prazo, perenes. Mas esses investimentos estão começando agora, algo em torno de R$ 30 milhões, para o plano de investimento dos próximos três anos", contou o sócio da Famosa, Luiz Roberto Barcelos.

Questão climática

O empresário explica que está transferindo para o Rio Grande do Norte e Piauí as plantações de banana e mamão por conta do ciclo de médio a longo de desenvolvimento da planta, o qual necessita de mais água para se desenvolver e gerar frutos de boa qualidade. Já no Ceará, continuam as plantações de melão e melancia, carros-chefes da empresa. Barcelos avalia ainda que, "para ter segurança hídrica dentro do Estado, só com a Transposição do Rio São Francisco e das bacias hidrográficas".

Isso porque, segundo expõe, as chuvas anuais tem uma média de 600 milímetros a 700 milímetros, enquanto a evaporação ocorre em grande intensidade devido ao sol forte, o que reduz rapidamente a umidade do solo cearense e ajuda a deixar os reservatórios em estado crítico.

"Nós temos muitos poços, mas boa parte é em água subterrânea, os quais, dependendo da região, a água pode ser salobra e não ter qualidade", acrescenta Carlos Porro, sócio da Agrícola Famosa. Ele informa que, para 2016, a empresa tem contratos para a entrega de 350 mil toneladas de frutas, o que a levou a Pernambuco e Piauí.

"Agora, isso não quer dizer que o governo tenha falhado, é uma questão climática", arremata Carlos Prado ao elogiar a ação da Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh) e afirmar que o governo do Ceará "tem dado toda a atenção ao setor produtivo, mas não é possível fazer mais do que isso".

Transposição e incentivos

Para dar fim a esta insegurança hídrica do Estado em um curto ou médio período de tempo, os empresários apontam a Transposição do Rio São Francisco como a melhor possibilidade. Entretanto, alertam para a necessidade de concluir as obras complementares, de responsabilidade do governo estadual, que devem levar todo o volume transposto desde Pernambuco até as áreas de plantio com dificuldade de abastecimento.

O Ministério da Integração garantiu, na última semana, que deve encher a barragem de Jati - primeira cidade cearense por onde a água deve chegar - em outubro. No entanto, para acelerar a chegada ao Castanhão, o Governo do Estado precisa concluir um trecho do Cinturão das Águas do Ceará (CAC) que interligará via o Riacho dos Porcos, o Rio Salgado e o Rio Jaguaribe, Jati e o Castanhão. "Sem que se complemente as obras, tudo vai se perder", alerta Carlos Prado.

Incentivar as culturas de maior impacto econômico também foi endossado pelos fruticultores como forma de selecionar melhor quais as culturas o Estado, em condições de dificuldade de abastecimento, deve valorizar. Para eles, plantios de arroz que necessita de água em abundância e geram poucos empregos e renda deviam ser preteridos aos produtores que utilizam gotejamento como técnica de irrigação e os que empregam muito e/ou comercializam produtos de grande valor agregado.

"Estamos defendendo uma lei que incentive a utilização da água para quem está gerando mais emprego e renda. Posso até não me encaixar dentro dessa equação, mas é o modelo que defendemos vide a situação do estado", informa Luiz Roberto Barcelos, que também é Presidente da Associação Brasileira de Produtores de Frutas e Derivados (Abrafruta).

Perda de investidores

Ele ainda destaca a perda de oportunidades do Ceará por conta da insegurança hídrica. "Poderíamos convidar outros grandes produtores de laranja, manga, uva... Para cultivar no Estado e não dá", lamenta, reforçando que "é fundamental que continue com essa política para manter o Ceará como terceiro maior exportador de frutas do País, que, apesar de quatro anos de seca, tem continuado assim devido aos esforços para manter a produção dentro do Estado".

Na avaliação do presidente da Abrafruta, o Ceará, mesmo possuindo uma boa gestão financeira e de recursos hídricos, acaba perdendo receita, vide a competição com outros estados - que oferecem, além da segurança hídrica, benefícios fiscais e estudos sobre a produção. O caso, inclusive, acaba afetando outros setores produtivos do Estado.
Diário do Nordeste.

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